Temos medo da morte. Quase todo mundo tem medo da morte e, se você não tem continue lendo assim mesmo pela oportunidade de desenvolver empatia e porque o assunto na verdade é outro… Talvez até mais perturbador mas necessário.

Temos medo da morte em geral por termos o instinto de permanecer, de continuar experimentando a consciência, continuar sendo quem somos e a morte ameaça ser o fim disso, o colapso da nossa consciência de que existimos. Por isso criamos crenças de vida após a morte ou até decidimos abdicar dessa ansiedade acreditando que deixamos de existir com a morte para não pensarmos mais nisso. Ou tentar não pensar…

No entanto…

Antes de mais nada! Esse não é um momento de inspiração meu, é um assunto bem abordado na filosofia e na psicologia, mas voltei a ele porque meu pais continuam em conflito com a descoberta de que estou “velho” e parecem sentir falta da criança que fui. Isso pelo jeito mexeu comigo… Com 55 anos, veja só… Entretanto vejo isso como uma qualidade: temos que nos importar, temos que nos questionar, temos que nos transformar enquanto estivermos conscientes (caso a consciência sobreviva à vida).

E é justamente aí que está a epifania: nos transformar.

Nós temos lembrança de boa parte da história desse corpo e da consciência que o habita, mas a pessoa que fomos aos 5 anos obviamente já “morreu”. Aliás, é bem capaz que, depois de 2020 a maioria de nós esteja muito diferente do que éramos há 12 meses.

Se pensarmos bem até mesmo de um dia para o outro, de um segundo para o outro é como se o que fomos tivesse deixado de existir, tivesse morrido.

Imagine que você transferisse sua consciência para uma máquina, será que poderia morrer sabendo que continuaria a viver na máquina? Duvido…

Tudo isso são temas muito bem abordados até na ficção científica (como o conto que linkei no parágrafo acima), mas, pelo menos eu, muitas vezes não trazemos essas reflexões para a nossa própria existência e consciência, afinal… Pensamos, logo existimos…

E as pessoas queridas que se tornaram instrumentos de ódio (fascismo, homofobia, bandido bom é bandido morto, fim aos direitos humanos, racismo) desde 2014 e tentamos nos tranquilizar dizendo que sempre foram assim, mas sabemos que não é verdade, que já foram boas pessoas e talvez possam voltar a ser, só que talvez seja mais assustador encarar a volatilidade da nossa consciência, da nossa identidade, que a possibilidade de monstros virem se escondendo em gente que até ontem tinham nossa admiração?

Eu gostaria de viver séculos, de ver para onde a humanidade vai, o que acontecerá em seguida, como os problemas serão resolvidos, quais não serão e que novos desafios surgirão, mas já há muito tempo sei que o Roney que observará os séculos porvir não serão eu, serão algo que se desenvolveu de mim, mas pode até ser muito mais resultado do meio que o influencia do que da minha… alma ou consciência supondo que algo assim exista.

Por outro lado… É… Tem um lado bom! Somos livres para nos transformar, para tentarmos ser pessoas melhores, para descobrir o que é ser uma pessoa melhor! Não temos ido muito bem nesse ponto, não é? Existem vários obstáculos, é claro! Nossa mente, sem uma certeza (ainda que ilusória) de permanência, pode mergulhar na dissociação de personalidade, pode se dissolver, e por isso temos muito dispositivos gravados até em nosso DNA para nos conferir alguma coesão de personalidade, ainda assim, é bom saber que temos alguma possibilidade de transformação, que, talvez, possamos superar aquela ansiedade quando alguém critica algo em nós ou desenvolver aquela capacidade que achávamos que não era para nós.

Depois de tudo isso vou te confessar… Eu queria ser permanente ;-)

Bônus: onde nesse texto defini o seu gênero ou o meu? Você notou o meu esforço para fazer um texto gênero neutro? Tive um sucesso razoável? (ainda não revisei)

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