Pode ler sem medo de spoilers.
Publicado em 2014 Estação 11 nos atira logo nas primeiras páginas em uma pandemia global severa e veloz como a comunicação na era moderna, no entanto não se trata de uma correria apocalíptica que se apoia no exercício especulativo para capturar a nossa atenção, eu diria inclusive que, como em toda boa história, o colapso da civilização é o pano de fundo onde vemos se descortinar um tema central: a memória da civilização.
Não é um spoiler que logo nas primeiras páginas é avisado que aquelas pessoas estão há poucos dias do colapso da civilização tecnológica e é bom avisar que a narrativa, que se inicia nos primeiros momentos da pandemia, oscila entre 20 anos antes e 20 anos depois tecendo as histórias das personagens principais e faz isso com maestria.
Muitas vezes o recurso de deixar fios suspensos servem apenas para gerar tensão em quem lê (ou assiste), mas Estação 11 é um mosaico que precisa ser montado assim para que possamos vivenciar plenamente a jornada.
Deixo o aviso aqui porque, sendo uma pessoa naturalmente cética, tive dificuldade na virada no primeiro terço do livro. Vale a pena passar por ela.
Quando escrevemos sobre uma obra original e que nos provoca tanto emoções como associações muito fortes podemos parecer meio exageradas, pelo menos sei que sou uma pessoa assim. Descobri isso relendo posts antigos, mas Estação 11 nesse momento realmente me pegou de jeito e posso explicar por que sem ter que recorrer a spoilers.
Somos levados pelos momentos iniciais de uma pandemia impiedosa e logo depois nos vemos vinte anos depois acompanhando artistas itinerantes que levam música e teatro para as vilas isoladas a que se reduziu a humanidade e temos temo para perceber como nos tornamos pequenos nas grandes extensões a percorrer entre cada condado e diante das florestas que retomaram o planeta antes de voltar para anos antes da pandemia, mas não para conhecer algum mistério, algum responsável e sim para encontrar de novo a civilização que foi perdida, para retornarmos para onde estávamos até poucos meses aqui no mundo de 2020.
Estação 11, eu diria, é sobre a jornada da civilização, sobre a importância da memória, de lembrar e entender o valor dela, o que tem valor nela, afinal, o que define a civilização? Luz? Conexão? Cultura? O que devemos transmitir para as nossas crianças sobre o passado e sobre as perspectivas de futuro? Devemos fugir do que nos causa dor ou será que ela é necessária?
Isso não quer dizer que as personagens são superficiais, a propósito, quando lemos uma distopia normalmente as especulações sobre a nova estrutura ou falta de estruturação costuma ter muito mais espaço sacrificando as chances de mergulhar mais nas personagens do que em Estação 11.
Veja bem, existem personagens que são nomeados por suas atividades, mas ainda assim temos oportunidade de nos colocar no lugar de vários deles e as personagens protagonistas são tão reais quanto deveriam. Vou deixar para você descobrir quem são porque creio que seria spoiler e, na verdade, talvez sejam outras para você, diferentes das minhas.
Resta comentar o título. Estação Onze é uma história dentro da história, mais ou menos… Só chegamos a conhecer sua trama e alguns detalhes, mas a história da história e sua essência, creio, são importantes como chave para expandir o significado e a carga emocional do livro.
Para concluir: como vivemos tempos de tramas complexas que só entendemos elaborando mapas mantais (Dark coff coff) é bom avisar que você pode ler calmamente pois tudo se explica muito claramente.
Ah! Só mais uma coisa. A obra é premiada e muito elogiada, mas deixe para ler sobre isso depois. Li sem saber e acho que analisamos melhor se não sabemos que prêmios uma obra recebeu e por quê.
Imagem: The Portal List – capa de algumas edições