Ele olha para o relógio que marca 2:54h da manhã em seus ponteiros prateados. Imagina como os tempos estão mudados. Estes punks entram em qualquer lugar e não respeitam mais nada, seria a moça parente da mulher na cama?
– Hei, moça! Não são permitidas visitas a esta hora, você vai ter que ir.
Ela responde sem se virar, apenas sua cabeça se inclina levemente sobre o ombro esquerdo. A voz que vem dela é doce, jovem e alegre, mas parece chegar a ele mais alta do que deveria no meio do coro de gemidos baixos e outros lamentos não tão baixos.
– É, os tempos estão mesmo mudados… Não é comum que me vejam… Mas eu não vou me demorar muito, mais alguns minutos e poderei levá-la, venha ver, ela está quase pronta! Já que você me vê talvez possa ver isso também!
– Olha, não sei o que você bebe, fuma ou injeta, mas no meu turno não vou permitir bagunça aqui!
Ele vai se aproximando seguro de que uma mocinha como aquela não daria muito problema afinal, negro, forte e com mais de 1,80m, ele sabia que era uma figura intimidadora. Apesar disso no fundo do seu peito ele sentia um vazio, como se o coração batesse sozinho no meio do vácuo.
– Não se preocupe, depois de hoje você não me verá novamente nem tão cedo! – Dizendo isso se volta para ele esticando o braço e oferecendo-lhe a mão. O rosto é belo, surpreendentemente belo, mas pálido como o gelo e os olhos negros como a noite. Entre as sombras da UTI ele tem a impressão que não há branco emoldurando aquelas grandes pupilas negras.
Ele olha para a mulher na cama e percebe que a luz parece mais escura ao redor do seu rosto, é como se uma bruma suave cobrisse seu corpo, mas sua boca sorria levemente, talvez tendo um sonho com uma época feliz e livre da doença que consome seu corpo.
– Vê? Ela já vai…
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