– Meu amor, acho que o leite azedou…
Tenho uns 22 anos e minha namorada entra no quarto dando uma notícia nesse tom, levemente triste, mas, espere, não foi isso que ela disse…
Ela tinha acabado de desligar o telefone e estava passando um recado da Patrícia.
Estudei com a Patrícia no preparatório para concursos e científico, na época ainda tinha esse nome. Patty é mais uma dessas amizades extremamente preciosas, mas que infelizmente se perderam nos afastamentos do tempo, das três décadas que me separam daquele dia.
Ela se formou médica e tenho certeza que deve ser uma excelente doutora.
Já aos 22 anos era com nostalgia que lembrava dos tempos de escola, do tipo de nostalgia boa, como aliás ainda tenho porque aqueles tempos passaram, mas vivo novos tipos de aventuras e histórias. A gente só não pode deixar de viver intensamente!
Patty era espírita e talvez por isso tenha dado suavemente a notícia para a minha namorada que me repassou no mesmo tom sem saber que me arremessava uma lança rápida capaz de dilacerar instantaneamente.
Explodi em choro antes mesmo da última sílaba da notícia terminar de invadir meus ouvidos. Daquele tipo de choro que explode e que não podemos controlar e muito menos explicar porque se abrimos a boca para falar é apenas uma nova onda de choro que sai por ela.
Nem por uma fração de nanossegundo me contrariei com a namorada (que a propósito está sentada aqui ao lado sem saber o que estou escrevendo) que me olhava com profunda empatia e arrependimento por não ter imaginado o efeito que a notícia teria, afinal essas coisas acontecem a todos e geralmente apenas lamentamos suavemente.
Esse era um caso especial, tratava-se não só de um professor de física, minha matéria preferida, mas de um dos mais jovens e mais vibrantes de vida, aliás, uma das pessoas mais vibrantes de vida que conheci.
– Mô, a Patty ligou. Disse que Pedro Paulo, o professor de física, morreu…
Lembro de cada momento de explosão de amor pela vida de Pedro Paulo e, até onde for possível para mim, jamais deixarei que esse legado se apague. Pedro Paulo pode ter atravessado o portal de onde nenhum de nós volta, mas seu legado permanecerá…