Tenho escrito pouco e muito raramente me manifesto sob efeito de forte emoção. Já se passaram três dias e penso que já posso falar sobre a aterradora destruição realizada contra o Brasil ao vandalizarem as sedes dos três poderes domingo passado (8 de janeiro de 2023).

Quando vi que estavam agredindo cavalos e destruindo obras de arte uma parte de mim foi tomada por ódio. Agredir animais é de uma falta de humanidade profunda e destruir obras de arte é um ato definitivo que apaga o que a humanidade tem de mais importante coletivamente: a memória.

Mesmo quando estava mais revoltado e uma parte de mim desejava que coisas ruins acontecessem com as pessoas que estavam lá, com todas aquelas pessoas sem discriminação, outra parte repetia que a maioria delas estava ali em desespero depois de passar os quatro últimos anos sob o equivalente moderno ao bombardeio contra o Laos: a enxurrada de delírios que se intensificou absurdamente nos últimos seis anos, mas vem de décadas. Isso no entanto é tema para o Meme de Carbono onde já andei falando sobre a seita que constrói prisões sem paredes em torno de pessoas que sequer nos parecem vulneráveis.

Vendo as pessoas presas fica a impressão mesmo que se trata de uma legião de tios e tias “do zap” que realmente acreditam que o comunismo vem aí, que o aborto será obrigatório, que as igrejas serão proibidas e outros absurdos tão sem sentido quanto a Terra plana, em que muitos deles também acreditam como se fosse uma porta de entrada para delírios maiores.

Para falar a verdade não sei onde quero chegar com esse post, simplesmente comecei a escrever. É, antes de mais nada, um desabafo, um jeito de colocar para fora.

Tenho pena daquelas pessoas? Tenho. Tenho raiva delas? Também. Acho que não tem jeito além de julgá-las como plenamente conscientes do movimento de que faziam parte? Acho. Quero que os financiadores dos acampamentos, do transporte (a maioria parece ter sido levada de São Paulo, Paraná e Minas Gerais) e do terrorismo digital sejam identificados e, de preferência, julgados como terroristas? Quero!

No entanto será que o topo dessa pirâmide é o dono da companhia de ônibus que fez parte do transporte? Talvez os líderes religiosos que organizaram caravanas? Será que Bolsonaro se encontra no vértice ou será que a instabilidade social e política no Brasil torna as coisas mais fáceis para mega corporações que agem através da extrema direita dos EUA para as quais o agronegócio é apenas um trocado e que investem em astronômicos fundos de investimento?

Tudo isso é assunto para o Meme de Carbono, mas aqui vou me dar ao direito de ser mais emotivo. É. Ainda estou abalado, mesmo com a boa notícia de que a bailarina de Brecheret foi encontrada.

O que quer que esteja acontecendo foi sério, muito sério! Temos visto amigues e parentes perdendo o contato com a realidade a ponto de se juntarem até fisicamente para pedir o fim da unidade nacional, das leis, da liberdade religiosa, dos poderes e pilares das sociedades modernas.

A gente se sente impotente como quando encontramos com uma pessoa ativista da Terra plana.

Veja, não é que só esse pessoal esteja com problemas para lidar com a realidade. Também vejo pessoas próximas totalmente alienadas, achando que o mundo inteiro é controlado por meia dúzia de bilionários e outras maluquices, mas elas pelo menos mantém algum contato com a realidade.

Tem muitos que dei como perdidos, parentes já na dita terceira idade, mas tem gente que lamento muito não poder mais compartilhar umas horas em um café observando o mundo seguindo suas histórias individuais e coletivas.

As pessoas conhecidas ainda é mais fácil de recuperar a empatia, mas e os desfiles de rostos anônimos que passam por nós pelas ruas? É como um amigo me disse várias vezes: “Me dá gatilho saber que 70% das pessoas por quem passo na rua votaram…” e não consegue descrever o que foi afinal a eleição de 2018 ou mesmo os mais de 45% de 2022. Somente depois dos atos de vandalismo a aceitação de Bolsonaro caiu para pouco acima de 20%.

De alguma forma temos que recuperar o equilíbrio em nossa diversidade… A bem da verdade sempre houve uma grande diversidade no Brasil, mas o equilíbrio era só para uns 10% que não eram alvo de preconceitos, então vou refrasear.

Espero que o caos que nos impuseram, a divisão que amplificaram, sirvam para fazer nascer em nós a consciência de que somos um só povo forjado na diversidade de vieses, gênero, raças, religiões e uma miríade de diversidades.

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